Às vezes sinto-te assim como se estivesses aqui, mas em contraluz.
Apenas como se te adivinhasse a silhueta, um perfil que se destaca dos raios de sol que te iluminam por trás, tão ao longe que não te posso tocar.
Sinto-te e não te vejo. Parece-me ouvir um ruído no corredor, como o roçar do tecido entre as pernas quando se caminha ao de leve sem fazer barulho com os pés descalços, nas minhas narinas o teu cheiro que se aproxima, volto-me para a porta a sorrir mas não estás lá. Espanto-me sempre de não te ver encostado ao umbral, a cabeça levemente tombada apoiada na madeira, um braço que abraça o tronco, o outro com a mão na face olhando para mim num doce convite.
Não estás ali, mas sei que me vês e por isso passo as mãos pelo cabelo, endireito as costas na cadeira, descontraio o rosto para ficar mais bonita. Gosto que me vejas mesmo quando não estás por perto e de tanto te pensar acabei por aceitar essa tua presença ausente.
Eu aqui, e tu como que do outro lado da porta, à distância de um trinco que se abre, de um braço, um abraço.
Vou abrindo janelas na esperança de te ver ao vivo caminhando em passo ligeiro pela calçada, a tua sombra que afaga as pedras, que sobe e desce muros e passeios numa dança ritmada que se chega a mim. Abro a caixa do correio para ver se uma carta tua, um postal, qualquer coisa que me prove que existes para lá dos meus sonhos.
Acabo sempre por te encontrar, às vezes em contraluz, às vezes duma forma mais real, um cheiro no elevador, uma frase solta no meu caminho, uns olhos da mesma cor que se cruzam com os meus na rua, um aperto de mãos em que o toque da pele me faz lembrar vagamente o teu e um arrepio por engano.
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