Quando eu era pequena, passávamos o Natal em Vila Nova de Ourém que, como outras vilas foi promovida a cidade e passou a chamar-se só Ourém, perdendo o pouco interesse que tinha e passando a ter nenhum, salvo um belíssimo castelo lá no alto do morro em Ourém, então "velha" e agora terra da qual desconheço a adjectivação, mas onde perdura o castelo e as ruelas e casario que o rodeiam.
Em Vila Nova de Ourém viviam:
- quando eu era mesmo pequena, os meus avós, os meus tios com a minha prima, a minha tia solteira e a minha bisavó;
- depois, os meus avós, a minha tia viúva com a minha prima, o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira;
- nos últimos anos da minha adolescência, o meu avô, a minha tia viúva com a minha prima, o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira;
- O Natal deixou de se passar em Vila Nova de Ourém há uns anos largos quando já só havia o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira.
Desses Natais da minha infância e juventude recordo noites mal dormidas num gelo de lençois húmidos e cobertores de papa pesadíssimos, a casa dos meus tios com um corredor que não acabava, quartos de um lado e de outro virados a norte e a nascente e para poente e sul só paredes sem janelas e tudo aquilo sem mais aquecimento que uma lareira na sala de estar que, quando o vento não estava de feição, ou seja sempre, atirava com rolos de fumo para dentro de casa, pondo todo o clã a tossir e a entrever-se desfocado com os olhos a picar.
O meu tio tinha um armazém de atoalhados e afins de maneira que a minha tia depositava a tarefa de escolher os presentes de Natal num dos empregados do armazém (cheirava a fazenda, pano turco e naftalina, o armazém) e presentava toda a família com embrulhos enormes de papel pardo atados com fitas vermelhas de dentro dos quais saiam panos de cozinha, toalhas turcas, renda a metro, jogos de cama de casal (dois lençois e duas fronhas) e outras utilidades domésticas que eu e os meus primos tínhamos de agradecer fingindo que apreciávamos muito mais ver aumentado o nosso enxoval aos oito anos de idade do que uma porcaria de um action man ou de uma caixa de lego.
O meu avô, que no fim da vida devia ter alzheimer e falava com a minha mãe como se ela fosse o Sr. Abrantes, tardes inteiras a conversar com a minha mãe, Sr. Abrantes, e como vai a família? e a minha mãe, pois vai-se andando menos mal, Sr. Lopes e logo depois o meu avô levantava-se e ia destapar o tacho do bacalhau que estava ao lume à procura da bengala enquanto me perguntava pela enésima vez se eu já tinha acabado o 7º ano e eu já a meio da faculdade. Depois chamava-me de lado, levava-me ao dito corredor sem fim e oh filha, olha para este hotel... olha que tens de dizer à tua mãe que eu não tenho dinheiro para pagar isto tudo...
Eram assim esses Natais.
Em Vila Nova de Ourém viviam:
- quando eu era mesmo pequena, os meus avós, os meus tios com a minha prima, a minha tia solteira e a minha bisavó;
- depois, os meus avós, a minha tia viúva com a minha prima, o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira;
- nos últimos anos da minha adolescência, o meu avô, a minha tia viúva com a minha prima, o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira;
- O Natal deixou de se passar em Vila Nova de Ourém há uns anos largos quando já só havia o marido da minha prima mais o filho dos dois e a minha tia solteira.
Desses Natais da minha infância e juventude recordo noites mal dormidas num gelo de lençois húmidos e cobertores de papa pesadíssimos, a casa dos meus tios com um corredor que não acabava, quartos de um lado e de outro virados a norte e a nascente e para poente e sul só paredes sem janelas e tudo aquilo sem mais aquecimento que uma lareira na sala de estar que, quando o vento não estava de feição, ou seja sempre, atirava com rolos de fumo para dentro de casa, pondo todo o clã a tossir e a entrever-se desfocado com os olhos a picar.
O meu tio tinha um armazém de atoalhados e afins de maneira que a minha tia depositava a tarefa de escolher os presentes de Natal num dos empregados do armazém (cheirava a fazenda, pano turco e naftalina, o armazém) e presentava toda a família com embrulhos enormes de papel pardo atados com fitas vermelhas de dentro dos quais saiam panos de cozinha, toalhas turcas, renda a metro, jogos de cama de casal (dois lençois e duas fronhas) e outras utilidades domésticas que eu e os meus primos tínhamos de agradecer fingindo que apreciávamos muito mais ver aumentado o nosso enxoval aos oito anos de idade do que uma porcaria de um action man ou de uma caixa de lego.
O meu avô, que no fim da vida devia ter alzheimer e falava com a minha mãe como se ela fosse o Sr. Abrantes, tardes inteiras a conversar com a minha mãe, Sr. Abrantes, e como vai a família? e a minha mãe, pois vai-se andando menos mal, Sr. Lopes e logo depois o meu avô levantava-se e ia destapar o tacho do bacalhau que estava ao lume à procura da bengala enquanto me perguntava pela enésima vez se eu já tinha acabado o 7º ano e eu já a meio da faculdade. Depois chamava-me de lado, levava-me ao dito corredor sem fim e oh filha, olha para este hotel... olha que tens de dizer à tua mãe que eu não tenho dinheiro para pagar isto tudo...
Eram assim esses Natais.
6 comentários:
amo essas tuas histórias, Teresa - (não consigo ser mais enfática do que isso para traduzir o prazer de lê-las)
Só passei para deixar os votos de um Feliz Natal e Óptimo 2009!
Bjs
Não imaginas o que eu já me ri com estas tuas histórias de Natal! Fizeste-me lembrar o Garcia Marquez, sabes?
Um beijo e espero que tenhas um Natal mais quentinho e com menos atoalhados... :-)
Desculpa, mas também me fartei de rir.
Boas festas (e beijos ao J e ao Gaston) e prometo que lá para Janeiro há blogojantar aqui no burgo.
Bj.
Um natal tranquilo e muito feliz, Teresa. E um beijinho meu.
Passei para deixar um beijinho natalício.
Feliz Natal!
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