A minha mãe em casa sózinha com a empregada.
Tocam à porta. Apresenta-se um rapaz, bom aspecto, exibe rapidamente um cartão e diz:
- Minha senhora, boa tarde. Sou funcionário da EDP e andamos aqui no prédio a verificar os contadores. O seu consumo de electricidade anda muito alto (atente-se nesta parte, isto toca qualquer um, certo?) e os técnicos da companhia pensam que deve haver um problema no contador.
- Mas os senhores estiveram a verificar a coluna do prédio aqui há pouco tempo...
- Ora nem mais. Foi precisamente aí que detectámos o problema (sentido de oportunidade...)
A senhora tem aí a sua factura?
A minha mãe vai buscar a factura, comenta que efectivamente anda a pagar muito, o homem entretanto já dentro de casa, porta fechada, olha a factura, diz pois, pois, começa a ver o contador, simula um telefonema para um qualquer Sr. Engº e mostra:
- A senhora está a ver aqui a roda do contador? Ora desligue lá tudo. Vê? A roda continua a rodar. Está a contar e no entanto a senhora não tem nada ligado.
De cima dos seus 82 anos e menos 10 cm do que tinha quando era nova, a minha mãe não vê nada mas diz que sim.
- Minha senhora, temos de substituir aqui uma peça. Vou ter de ir à rua comprar e tem de ser já, que é quase uma hora e as lojas depois fecham. (convenhamos que aqui, já é preciso apostar bastante na credulidade do cliente).
- Bom, então vá, esteja à vontade.
- A senhora vai ter é de me dar o dinheiro para fazer a compra.
- E quanto é?
- São entre 50 e 60 euros.
- Então vocês não trazem dinheiro? (a minha mãe começa a achar estranho)
- Não, não. A EDP não nos dá dinheiro para estes trabalhos. Tem de ser o cliente a pagar a peça na altura, isto no caso de pretender diminuir o consumo.
A minha mãe vai ao quarto, a empregada atrás: "a senhora não lhe dê o dinheiro, isto é muito esquisito".
Entre ser roubada e sujeitar-se a um tratamento menos simpático, a minha mãe opta por ser roubada. Pega em duas notas de 5 euros, volta para o pé do rapaz e mente:
- Só tenho 10 euros em casa. Não tenho mais. Mas o senhor para sair com o dinheiro tem de deixar aqui o seu cartão.
- Com certeza, minha senhora. Aqui está.
Pousa o cartão na mesinha do hall, dá mais dois dedos de conversa, distrai as duas para recolher o cartão e vai-se embora entre cumprimentos e até já's.
Isto contou-me a minha mãe hoje, desolada, dizendo que está uma velha, como é que se deixou enganar desta maneira, que já se fartou de chorar, que a cabeça já não é o que era, que foi uma parva, que o meu irmão ralhou com ela, que ligou para a EDP a contar a história e que de lá ralharam também com ela e patati e patatá.
Tentei consolá-la o melhor que pude. Disse-lhe que ninguém olha para os cartões com atenção, que ela não era com certeza a única que tinha levado o golpe, que tinha feito bem em entrar no jogo do homem mas fingindo que não tinha mais dinheiro em casa, que às tantas ele tinha fome, filhos doentes e que no fundo até tinha revelado alguma imaginação, que 10 euros não era muito comparado com uma carga de pancada e sei lá que mais.
Claro que também lhe disse que tinha tido imensa sorte ou os anjos a velarem por ela e pedi-lhe para me prometer que punha sempre a corrente antes de abrir a porta e que, em casos parecidos, pedisse para ver a identificação como deve ser e ligasse para a companhia antes de deixar entrar pessoas em casa.
Contem esta história aos vossos amigos e familiares. Nem toda a gente tem a sorte da minha mãe.
junho 07, 2007
Roubar com imaginação
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1 comentário:
mta sorte mesmo
o problema é que os sacanas sabem escolher onde vão.....
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