O meu pai sentado num banquinho no cais, calções, camisa de mangas curtas, panamá, a cana de pesca na mão, ao lado um saco com linhas, anzóis, chumbos, carretos, tesouras enferrujadas e um cheiro peculiar que guardo na memória, eu de cócoras ao lado, não mexas aí que te picas, posso pôr o bicho na anzol, pai? e ele a explicar-me tudo com infinita paciência, a minhoca a enrolar-se nos meus dedos e eu já a não querer mexer naquilo mas sem dar o braço a torcer, ao fim do dia um balde com água do mar e dois, três peixinhos minúsculos lá dentro, explorando o balde em eternos círculos até que a maré virasse e regressassem às águas da baía.
Quando chegavam as traineiras amarelas “Apanha Submarina de Algas”, o ar enchia-se daquele cheiro a profundezas do mar, as algas castanhas a quererem escapar-se, os barcos só com uma bordinha de fora de tanto peso, os apanhadores ainda fardados de preto com as máscaras, as botijas, as barbatanas, todo o santo dia para cima e para baixo, para baixo e para cima a encherem as redes para serem içadas para a traineira, eu a vê-los descarregar aquela verdura toda no cais, interrogando-me como seria o fundo do mar, floresta imensa que nunca se esgotava, pois que todos os dias vinham sempre os mesmos mergulhadores, as mesmas traineiras a deitar por fora.
Na areia da baía as fiadas de barracas, lona de riscas coloridas, remendos equivocados, telhados em bico, senhoras compostas à sombra dos avançados, meninos a jogar ao prego, ao mata, ao ringue e à bola, à espera da digestão e do banho do meio-dia. Criadas fardadas a trazerem o almoço em cestos com panos brancos, a D. Natália com a caixa verde à cabeça e dentro da caixa fatias de pão-de-ló de Alfeizerão, e outra de que não me lembro o nome com uma caixa não verde mas vermelha, lá dentro bolacha americana, batatas fritas em saquinhos de plástico gordurosos, tremoços, amendoins e pevides, varizes nas pernas tisnadas do sol, cansadas de caminhar o areal vezes sem conta.
Nós do lado menos bem da praia, mas também não na ponta pior, digamos que a meio, pois embora as barracas fossem iguais, a areia a mesma e a água do mar igualmente barrenta, dum lado as pessoas tinham nomes muito compridos e alcunhas como Bibá, Bábá, Bébé, e do outro os nomes já só Manel e Zé e apelidos dois, no máximo três e isso, parecendo que não, fazia toda a diferença.
Pois nós do lado menos bem da praia, mas também não na ponta pior, digamos que a meio, a minha tia solteira que nunca usou calças nem fato de banho sentada no fundo da barraca com medo que lhe vissem as pernas do joelho para baixo, o meu avô de cabeleira branca, camisa e calças de linho a dormitar na cadeira, a minha mãe e a minha avó compostas à sombra do avançado, eu a fazer esculturas na areia e a vê-las desaparecer com a subida da maré, ao fim da tarde o meu pai de calções, camisa de mangas curtas e panamá, que nos vinha buscar depois de passar o dia sentado num banquinho do cais a coleccionar peixinhos minúsculos que exploravam o balde em eternos círculos até que ele os deitasse a mar.
Quando chegavam as traineiras amarelas “Apanha Submarina de Algas”, o ar enchia-se daquele cheiro a profundezas do mar, as algas castanhas a quererem escapar-se, os barcos só com uma bordinha de fora de tanto peso, os apanhadores ainda fardados de preto com as máscaras, as botijas, as barbatanas, todo o santo dia para cima e para baixo, para baixo e para cima a encherem as redes para serem içadas para a traineira, eu a vê-los descarregar aquela verdura toda no cais, interrogando-me como seria o fundo do mar, floresta imensa que nunca se esgotava, pois que todos os dias vinham sempre os mesmos mergulhadores, as mesmas traineiras a deitar por fora.
Na areia da baía as fiadas de barracas, lona de riscas coloridas, remendos equivocados, telhados em bico, senhoras compostas à sombra dos avançados, meninos a jogar ao prego, ao mata, ao ringue e à bola, à espera da digestão e do banho do meio-dia. Criadas fardadas a trazerem o almoço em cestos com panos brancos, a D. Natália com a caixa verde à cabeça e dentro da caixa fatias de pão-de-ló de Alfeizerão, e outra de que não me lembro o nome com uma caixa não verde mas vermelha, lá dentro bolacha americana, batatas fritas em saquinhos de plástico gordurosos, tremoços, amendoins e pevides, varizes nas pernas tisnadas do sol, cansadas de caminhar o areal vezes sem conta.
Nós do lado menos bem da praia, mas também não na ponta pior, digamos que a meio, pois embora as barracas fossem iguais, a areia a mesma e a água do mar igualmente barrenta, dum lado as pessoas tinham nomes muito compridos e alcunhas como Bibá, Bábá, Bébé, e do outro os nomes já só Manel e Zé e apelidos dois, no máximo três e isso, parecendo que não, fazia toda a diferença.
Pois nós do lado menos bem da praia, mas também não na ponta pior, digamos que a meio, a minha tia solteira que nunca usou calças nem fato de banho sentada no fundo da barraca com medo que lhe vissem as pernas do joelho para baixo, o meu avô de cabeleira branca, camisa e calças de linho a dormitar na cadeira, a minha mãe e a minha avó compostas à sombra do avançado, eu a fazer esculturas na areia e a vê-las desaparecer com a subida da maré, ao fim da tarde o meu pai de calções, camisa de mangas curtas e panamá, que nos vinha buscar depois de passar o dia sentado num banquinho do cais a coleccionar peixinhos minúsculos que exploravam o balde em eternos círculos até que ele os deitasse a mar.
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