Começou com este, que saíu dorido, a pasta rija a resistir fazendo nascer bolhas nas polpas, uma hora de trabalho numa noite de sexta-feira em que a aula nos afastou dos pincéis e pasteis que nos prolongam os dedos.
Habitou sentado numa luz sobre um móvel da sala, até que a comichão nos dedos se fez de novo sentir, vontade de amassar outra vez aquilo tudo, de lutar contra a inércia da pasta, domá-la aquecendo-o com o afago das palmas como se uma carícia fosse e soltar de mim um rosto que desconheço e que sinapses incompreensíveis me levam a associar a um senador romano do tempo de Júlio César.
Observo-o mais de perto, não me interessa se está bem ou mal, mas apenas que gosto de sentir com o olhar as marcas que os meus dedos texturaram na superfície, irregularidades alisadas, puxadas, coladas, com toda a incerteza que transparece de um rosto que me escapa.
Na última aula, outra hora de trabalho e o rosto desfez-se transformando-se numa vaga aproximação do modelo que, em pose fechada, ia rodando sobre a plataforma giratória. Trouxe-a (pois que mudou de género) para casa dentro de uma caixa de plástico intentando melhorar o que o escasso tempo de aula permitira.
Sentei-me à mesa e, depois de olhar para ela, preferi deixá-la assim, tosca, como me saíu dos dedos. Fica por ali, até que a comichão volte e a transforme noutra coisa qualquer.
5 comentários:
que giras comichoes!
silvia r
trans
formas
às vezes eu descubro blogs fantásticos; outras vezes blogs fantásticos descobrem-me
a mim!
Tão bom, o que recordei aqui, neste barro!
E esta música?
Hummm...
beijinho
Gostei :)
da variação da virose! muito.
Pega-se!
Está fan-tás-ti-co. Que raiva não morar em Lisboa (só por coisas destas). Mas há-de chegar o dia...
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